Arraial d’Ajuda é um distrito de Porto Seguro que há algum tempo atrai as pessoas com sua pequena vila e praias paradisíacas, natureza exuberante e construções antigas em estilo único. Turistas de todo o mundo fizeram do lugar um ponto de encontro cult. Mas esse lugar fez parte da minha vida muito antes de se tornar tão badalado. E minha passagem por lá foi decisiva para seguir com minha verdadeira vocação.   

Por volta de 1991, eu me separei, deixei a confecção que estava tocando em Petrópolis e fui para a Bahia, onde passava os verões desde os meus 10 anos. Acabei chegando em Arraial d’Ajuda: um lugar lindo, que não tinha nem energia elétrica direito, o chão era de barro e onde vivia uma galera superalternativa. Eu não tinha obrigação de pentear o cabelo e para estar bem precisava, no máximo, colocar uma sandália Havaiana nos pés. Pensei: “Nossa! Que lugar legal”. Saí do mundo da moda, de ser totalmente patricinha, para me encontrar ali, naquela vida simples. “É disso que eu gosto, vou ficar por aqui”, decidi.    

O problema é que eu não conhecia ninguém e nem tinha dinheiro para me bancar naquele lugar. A sorte é que fiz amizade com um cara que tinha uma barraca na praia. Descobri que ele quase nunca trabalhava, estava sempre “em meio à natureza”. Perguntei se eu poderia cuidar da barraca dele. Ele topou e eu arregacei as mangas. Passei a morar na parte de cima da barraca, em frente ao mar mesmo, e a tocar os negócios até o último cliente. Passei a diversificar a oferta fazendo sanduíche natural, salada de fruta, bolos e tortas, receitas que sempre adorei. E o negócio começou a dar certo, sabe?

Um dia, o padeiro da cidade foi dar um passeio e não voltou. Não tinha pão para ninguém. Corri em um orelhão e liguei para a minha avó. Peguei com ela a receita do seu pão e todo mundo da redondeza passou a comprar comigo. Naquela época não existia celular ou Internet para procurar as receitas no Google. Não havia biblioteca ali, caso quisesse pesquisar sobre gastronomia em alguma enciclopédia.

As coisas foram melhorando e a minha barraca logo se tornou o point. Estava descobrindo e sedimentando o meu dom de cozinhar, servir e compartilhar conhecimento através de uma barraca na praia. Eu percebi que levava jeito para a coisa. Foi quando me deu o estalo de seguir em frente. A barraca de praia foi o trampolim que me impulsionou para ir com coragem e determinação para França estudar fotografia e gastronomia, mesmo sem ter dinheiro ou falar a língua. Fui atrás do meu pai, que só tinha visto uma vez na vida, para tirar meu passaporte francês e pronto: ninguém me seguraria mais!